quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Homens de Chico?

“Diz que deu, diz que Deus, diz que Deus dará,
Não vou duvidar, ô nega e se Deus não dá, como é que vai ficar, ô nega?
Diz que deu, diz que dá, e se Deus negar, ô nega
Eu vou me indignar e chega, Deus dará, deus dará
Deus é um cara gozador, adora brincadeira
Pois prá me jogar no mundo, tinha o mundo inteiro
Mas achou muito engraçado me botar cabreiro
Na barriga da miséria nasci batuqueiro
Eu sou do rio de janeiro
Diz que Deus dará, diz que dá, não vou duvidar, ô nega
E se Deus não dá, como é que vai ficar, ô nega?
Diz que deu, diz que dá, e se Deus negar, ô nega
Eu vou me indignar e chega, Deus dará, Deus dará
Jesus cristo ainda me paga, um dia ainda me explica
Como é que pôs no mundo essa pouca titica
Vou correr o mundo afora, dar uma canjica
Que prá ver se alguém me embala ao ronco da cuíca
E aquele abraço prá quem fica!”...

Quando eu era menino tive muitas bolas devoradas pelo cachorro do vizinho. Um chute mais forte, uma espalmada do goleiro e a bola caia do outro lado do muro. Já era. O tal vizinho, dono do cachorro, trabalhava em circo. Era o palhaço Fred. Ele “devolvia”, de lá pra cá do muro, os farrapos e restos das bolas destroçadas. Eu não achava a menor graça. Verdadeira palhaçada!

Em Jacarepaguá, início da adolescência. Horas e horas no banheiro, “lendo” Carlos Zéfiro. Nada de paz. Tudo muito escondido. Não podia permitir ser pego e nem visto. Nem por Deus! Aí me informaram que o Criador era onisciente. E assim me percebi um pecador.

Mais tarde, cansado de reincidir no mesmo pecado, finalmente mudei de vida. Conheci meninas. Muito sarro, esperando a oportunidade da primeira transa. Quando rolou eu gostei tanto que decidi executar um projeto secreto: Bater todos os recordes, comer todas!

Qual o quê. Demorei a desenvolver minha canalhice até o nível desejado. Quando estava chegando lá surgiu a AIDS. No início todos achavam que apenas os homossexuais eram vítimas da doença. A tranqüilidade acabou quando descobriram que todo mundo estava no risco. Pé no freio. Transar só com as namoradas. As “confiáveis”, é claro!

De namorada em namorada acabei casado. Já não acreditava mais em pecado. Agora a repressão era por conta da prudência, da fidelidade e da ética. Já não temia a Deus. Temia a mim mesmo. E me vigiava atentamente, evitando cometer deslizes.

“Tinha cá pra mim
Que agora sim
Eu vivia enfim
O grande amor
Mentira
Me atirei assim
De trampolim
Fui até o fim um amador
Passava um verão
A água e pão
Dava o meu quinhão
Pro grande amor
Mentira
Eu botava a mão
No fogo então
Com meu coração de fiador

Hoje eu tenho apenas
Uma pedra no meu peito
Exijo respeito
Não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira

Fui muito fiel
Comprei anel
Botei no papel
O grande amor
Mentira
Reservei hotel
Sarapatel
E lua de mel
Em Salvador
Fui rezar na Sé
Pra São José
Que eu levava fé
No grande amor
Mentira
Fiz promessa até
Pra Oxumaré
De subir a pé o Redentor

Hoje eu tenho apenas
Uma pedra no meu peito
Exijo respeito
Não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor

Mentira”

O casamento, que era doce, acabou-se. Vácuo total. Estava eu diante do caos.
Tive que fazer papel de Deus e recriar meu universo. Imagino o trabalho que teve a Divindade. Para reconstruir um mundinho para mim estou tendo um trabalho danado. Imagina Ele para criar todo esse mundão! Mesmo Todo Poderoso merecia mesmo aquela folga no sétimo dia.

Pensa que acabaram as restrições? Acredita que a Senhora Liberdade abriu suas asas sobre mim? Nada! Adulto? Classe média? Só se ferra! Trabalhar, educar os filhos, cuidar da casa. Até aprendi a cozinhar. Eu, logo eu, que maldizia a cozinha. Toda razão para meu amigo Tanaka quando diz:

 - “Não conheço um que não pague pela boca!”

Mas se a vida nem sempre é bela, posso afirmar que ela é sempre interessante.

Igual aquela mulher que não chama atenção pela beleza, mas que tem seus mistérios e que passa uma atração irresistível. Vinícius que me desculpe, mas o tesão é fundamental.

Então meu amigo, se você me perguntar como vai a vida, vou responder ao pé do seu ouvido: - “Tô comendo!”

Mentira.


4 comentários:

  1. Muito legal essa ideia de relatar o que passou e o que se passa atualmente.

    Uma coisa é certa: As composições do Chico, pelo menos uma, é perfil de cada um de nós, de cada um dos brasileiros.

    Continue com o seu blog enquanto eu procuro uma essência para criar o meu. Quem sabe não criamos um projeto?

    Um abraço.

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  2. Não abandone, nunca, o blog.
    Você é inspirado e escreve bem.

    [].

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  3. Gostei muito da retrospectiva, mas achei que seu problema é o foco. Desde a adolescência não muda! Ou é mentira?

    Um beijo

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  4. Adorei,parabéns! Você precisa escrever um livro, tem estilo próprio e sabe brincar com as palavras. Tem uma professora de Língua Portuguesa precisando dessa inspiração...

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