quarta-feira, 30 de março de 2011

A vida anda ruim na aldeia

Ontem morreu José Alencar, ex-vice-presidente, 79 anos. Lutou bravamente contra o câncer por 13 anos, sobrevivendo recentemente a complicadíssimas cirurgias.

Sua luta pela vida tornou-se conhecida por ser homem público e pela sua atitude sempre positiva e sem demonstrar nenhuma revolta. Gostava da vida e queria vivê-la enquanto pudesse, mesmo sem saúde. Sabia da proximidade da morte inevitável, mas não paralisou diante dela: aproveitou seus últimos dias de vida da melhor maneira possível: vivendo.

Ontem foi decretada a morte cerebral do meu sobrinho neto, Samuel, de apenas 3 anos de idade. Ocorreu após uma parada respiratória durante pequena e rotineira cirurgia infantil de fimose e ajuste de posição dos testículos.

Pedro Bial, em 2006, após o enterro do comediante Bussunda, escreveu um texto onde ele dizia que morrer é ridículo. Fazia tempo que eu não relia, mas situações tão distintas que envolvem o tema me fizeram voltar aos arquivos:

"Assisti a algumas imagens do velório do Bussunda, quando os colegas do Casseta & Planeta deram seus depoimentos. Parecia que a qualquer instante iria estourar uma piada. Estava tudo sério demais, faltava a esculhambação, a zombaria, a desestruturação da cena. Mas nada acontecia ali de risível, era só dor e a perplexidade,que é mesmo o que causa em todos os que ficam.
A verdade é que não havia nada a acrescentar no roteiro: a morte, por si só,é uma piada pronta. Morrer é ridículo.
Você combinou de jantar com a namorada,está em pleno tratamento dentário,tem planos pra semana que vem, precisa autenticar um documento em cartório,colocar gasolina no carro e no meio da tarde morre. Como assim? E os e-mails que você ainda não abriu, o livro que ficou pela metade, o telefonema que você prometeu dar à tardinha para um cliente?
Não sei de onde tiraram esta idéia: morrer. A troco? Você passou mais de 10 anos da sua vida dentro de um colégio estudando fórmulas químicas que não serviriam pra nada, mas se manteve lá, fez as provas, foi em frente.
Praticou muita educação física, quase perdeu o fôlego, mas não desistiu.
Passou madrugadas sem dormir para estudar PRO vestibular mesmo sem ter certeza do que gostaria de fazer da vida, cheio de dúvidas quanto à profissão escolhida, mas era hora de decidir então decidiu, e mais uma vez foi em frente...
De uma hora pra outra, tudo isso termina numa colisão na freeway, numa artéria entupida, num disparo feito por um delinquente que gostou do seu tênis. Qual é? Morrer é um chiste.
Obriga você a sair no melhor da festa sem se despedir de ninguém, sem ter dançado com a garota mais linda, sem ter tido tempo de ouvir outra vez sua música preferida. Você deixou em casa suas camisas penduradas nos cabides, sua toalha úmida no varal, e penduradas também algumas contas. Os outros vão ser obrigados a arrumar suas tralhas, a mexer nas suas gavetas, a apagar as
pistas que você deixou durante uma vida inteira. Logo você, que sempre dizia: das minhas coisas cuido eu.
Que pegadinha macabra: você sai sem tomar café e talvez não almoce, caminha por uma rua e talvez não chegue na próxima esquina, começa a falar e talvez não conclua o que pretende dizer. Não faz exames médicos, fuma dois maços por dia, bebe de tudo, curte costelas gordas e mulheres magras e morre num sábado de manhã. Se faz check-up regulares e não tem vícios, morre do mesmo jeito. Isso é para ser levado a sério?
Tendo mais de cem anos de idade, vá lá, o sono eterno pode ser bem-vindo.
Já não há mesmo muito a fazer, o corpo não acompanha a mente, e a mente também já rateia, sem falar que há quase nada guardado nas gavetas. Ok, hora de descansar em paz. Mas antes de viver tudo ? Morrer cedo é uma transgressão, desfaz a ordem natural das coisas. Morrer é um exagero.
E, como se sabe, o exagero é a matéria-prima das piadas. Só que esta não tem graça.
Por isso viva tudo que há para viver.
Não se apegue às coisas pequenas e inúteis da Vida...
Perdoe....sempre!!!"
(Pedro Bial)

 
Recentemente eu já havia lembrado do texto do Pedro Bial enquanto pensava não em morte, mas na própria vida e eu iria mesmo procurá-lo (o texto, não o Pedro) para reler trocando o verbo morrer pelo viver: “Viver é ridículo”.

Trocar as palavras não invalidaria o texto original, mas contestaria a idéia de ridicularizar a morte e não a vida, pois acreditava que, na verdade, era vida que ele gostaria de criticar, o que poderia parecer politicamente incorretíssimo e, talvez por isso, evitado por ele.

Hoje percebo que nem mesmo a vida poderia ser o centro da crítica. Vida e morte existem por si mesmas. Ambas tem seu tempo definidas pelas nossas condições de saúde, de exposição ao risco, dos jogos de probabilidade de fatalidades ocorrerem, o que chamamos de azar ou sorte, o que inclui os fatores históricos, políticos e sociais da região onde aleatoriamente nascemos.

Mais uma vez cai no centro das minhas criticas, também politicamente incorretas, uma coisa que é extremamente cultuada: a esperança.

“A esperança é ridícula”.

Entenda-se por esperança o extremo desejo que algo aconteça ou a simples expectativa que um evento se realize de acordo com os nossos planos.

Aguardamos com uma certeza absurdamente cega os resultados de nossas ações. Acreditamos ser divinamente merecedores de respostas às nossas preces. Chamamos de “lei natural das coisas” uma série de sequencias apoiadas no nosso desejo de que tudo caminhe seguramente dentro desta limitada lógica. Assim, morrem os mais velhos primeiro, as crianças tornam-se jovens, depois adultos. Estes envelhecem e entram, aí sim, no momento aceitável da morte.

Baseados nesta lógica criamos nosso filho pensando no amanhã: poupamos dinheiro para garantir-lhe melhor futuro, sacrificamos, se possível, nosso tempo, saúde e lazer em uma segunda jornada de trabalho,  para garantir-lhe, desde já, sua saúde, seu lazer, sua casa própria e seus estudos até o doutorado, etc.

Aqui entra a substituição da palavra “morrer” por “ter esperança”, no texto do Bial. Releia-o desta maneira. Você há de concluir que não é a morte que é ridícula. Ridículo é levar a vida sem sequer pensar que a morte pode ocorrer a qualquer momento e não viver sabendo que devemos viver a vida intensamente,  em cada momento que ainda a temos. Assim como fazem as crianças, que não pensam em passado, nem em futuro. Simplesmente vivem.

Assim fez, muito bem, o Samuel.

Termino o meu texto de maneira parecida com o de Pedro Bial. Apenas completo, entre parenteses, a última frase, para fugir da pieguice do "Big Brother":

"...Por isso viva tudo que há para viver.

Não se apegue às coisas pequenas e inúteis da Vida...

Perdoe....sempre (que puder)!!!"

segunda-feira, 14 de março de 2011

Blog Duas Fridas... Eu recomendo!

Não é porque a Helena é minha amiga não! As meninas são demais. Eu estou aqui reaprendendo a escrever, lendo artigos e notícias para buscar inspiração e voltar para a realidade pós-carnavalesca. De repente vou ao Blog Duas Fridas e leio esta postagem tipo “Pô aí! Tudo a ver!”. Tem jeito não! Ctrl C e Ctrl V. Espero que cause impacto, sem querer, com isso, "impactar” (IRC!):
                                                      
Salvando palavras

Li um artigo do Sérgio Rodrigues que lamentava o desaparecimento da palavra “maremoto”, substituída pela implacável “tsunami”. É um texto curtinho, bem escrito, com sacadas bem humoradas mas não óbvias e no qual o autor, embora se ressinta da perda, aceita e registra a inovação, sob protesto.

Não vejo outra maneira de lidar com as palavras, com a linguagem, ente pulsante e maleável, que é de todos e de ninguém. Nós que mantemos com ela relação mais intensa somos assediados pelas dúvidas sobre onde ceder e como resistir, onde encontrar a regra definitiva – como se fosse exata isso que nem é ciência, mas organismo vivo complexo e mutante.

Eu vivo oscilando entre acolher e até mesmo defender o novo – como presidenta – e recusar aberrações como “inicializar” (cruz credo!). Por um lado, persigo com sanha assassina o onipresente  ”complicado” , essa erva daninha que contamina todo tipo de discurso e qualifica tudo:  o trânsito, o aumento do salário, o Oriente Médio e o banheiro químico. Tudo é complicado; nunca mais as coisas estiveram congestionadas, distantes, complexas ou inviáveis. Confesso, porém, que acompanho certos modismos, tipo, usar “tipo” como vírgula ou dois pontos na fala – mas vamocombiná que tem gente que usa como respira, chato demais!

Tudo isso para dizer que eu não me considero uma conservadora apegada e intransigente, mas  quero me juntar ao  Sergio nesse lamento pela supressão de  ”maremoto”. Mais uma palavra que se vai, empobrecendo a língua e a todos nós. Seria louvável uma iniciativa como a do “Save the words”, que estimula o visitante a conhecer e adotar novas palavras, espalhando-as, salvando-as do esquecimento. Os responsáveis pelo site afirmam que  ”90% do que escrevemos é comunicado por apenas 7 mil palavras“.  Desconheço a fonte da informação mas me parece verossímil. Lendo os jornais ou assistindo ao notíciário televisivo tenho a impressão de que usam bem menos, uma mistura de preguiça, pressa e descaso tamanha que às vezes sequer conseguimos distinguir onde termina uma matéria e começa outra.

Se de fato as palavras são roupas que a gente veste, talvez estejamos botando fora algumas que ainda nos cabem, deixando de lado tantas outras clássicas e úteis, e repetindo muito alguns  modelos. Apesar de ter à disposição um guarda-roupa vasto, diversificado e belíssimo.

Não põe corda no meu bloco!

Não poderia ser diferente: o carnaval 2011 no Rio de Janeiro bombou!

A escritora e pesquisadora Eneida de Moraes, dizia que o carnaval possui três grandes inimigos: O estado, a igreja e a chuva. A igreja foi para algum retiro, a prefeitura tentou “organizar”, autorizando um número limitado de blocos, entre os inúmeros que surgem a cada ano. Aumentou o número de banheiros químicos, e com eles a repressão e o “choque de ordem”.  Aí foi prefeito fingindo tocar tamborim em tudo que é bateria da Sapucaí. Bobeou e o governador também entrou na dança, vestido de papagaio de pirata. Os dois em busca dos louros da vitória do povo do Rio, que superou, com sua alegria, o abandono das autoridades, a falta de segurança e o seu próprio desânimo, que o levava “paulisticamente” a anuais engarrafamentos nas estradas para a Região dos Lagos.

O povo do Rio, rejuvenescido, voltou para suas ruas no carnaval.

Há poucos anos eu corria de carro toda a cidade com meus filhos para mostrar para eles a nossa maior festa, e a gente via uma cidade deserta. Este ano, a cada evento escolhido, tivemos que evitar algumas multidões para chegar à multidão desejada. E cada um escolhia a sua. E Poderiamos ir a mais de uma. Fartura! Este é o Rio de Janeiro: Rio de alegria, de beleza, de criatividade. O povo se reconhecendo em seu carnaval.

E o carioca, que não gosta sequer de dias nublados, saiu na chuva, meteu o pé na lama, para cantar por aí:

“Eu sou o Rio, e rio à toa!
Só rio de quem me impede sorrir...”

Parabéns, Cidade MARAVILHOSA!

"Demorô!"