quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Fala

"No princípio era o Verbo; e Verbo estava com Deus; e o Verbo era Deus.”

Verbo, palavra, poder.

Sendo a palavra uma forma de poder, de energia, tal como o amor e a luz, ela encontra seu oposto na sua ausência. Dizem que o oposto do amor é o ódio. Não acho que seja. Acredito ser a indiferença, Assim como da luz, é o escuro e da fala, o silêncio.

Há quem se sinta confortável no escuro, na indiferença, no silêncio. Mas a manutenção de tal conforto se torna egoísta quando o espaço é dividido com outro ser humano. É da nossa natureza procurar a luz, o amor e o entendimento. Quando o silêncio substitui o entendimento torna-se arbitrário. Leva ao afastamento, ao abandono ou ao conflito.

O entendimento geralmente é encontrado através do diálogo, com a troca de palavras plenas de amor, em busca da luz.

Silenciar pode indicar duas coisas, ambas equivocadas: Ou nos sentimos incapazes de nos fazermos entender, ou acreditamos que o outro é incapaz de nos entender.

Pode ainda indicar a indiferença. E assim traz as trevas, o vazio do desamor.

Muitas vezes o silêncio indica fragilidade, nasce do temor. O temor de ser invadido, ferido, incomodado. Outras tantas demonstra soberba: O outro não “merece” resposta.

Há, no entanto, momentos em que o silêncio é um dom. Quando serve de resposta a uma ofensa, por exemplo, ou quando realmente não se há o que falar, apenas ouvir.

Na maioria das vezes ele é falso. É exterior. A boca cala, mas a mente vive numa eterna discussão.

Eduardo Galeano, escritor uruguaio, cita, em seu livro As Veias Abertas da América Latina, uma bela frase sobre o silêncio. Está incluída na proclamação da Junta Tuitiva de los Derechos del Pueblo, de 1809, em La Paz:

Temos guardado um silêncio bastante parecido com a estupidez”.

É o deixar-se oprimir.

Paulinho da Viola, por outro lado, reivindica o silêncio para alcançar profundidade, capaz de levá-lo a fazer um samba sobre o infinito

Silêncio por favor
Enquanto esqueço um pouco
a dor no peito
Não diga nada
sobre meus defeitos
Eu não me lembro mais
quem me deixou assim
Hoje eu quero apenas
Uma pausa de mil compassos
Para ver as meninas
E nada mais nos braços
Só este amor
assim descontraído
Quem sabe de tudo não fale
Quem não sabe nada se cale
Se for preciso eu repito
Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito
Porque hoje eu vou fazer
Ao meu jeito eu vou fazer
Um samba sobre o infinito

Cartola, por sua vez, é sábio e delicado ao confirmar à sua amada que já amara alguém intensamente, e faz, do silêncio, proteção:

Tive, sim
Outro grande amor antes do teu
Tive, sim
O que ela sonhava eram os meus sonhos e assim
Íamos vivendo em paz
Nosso lar, em nosso lar sempre houve alegria
Eu vivia tão contente
Como contente ao teu lado estou
Tive, sim
Mas comparar com o teu amor seria o fim
Eu vou calar
Pois não pretendo amor te magoar


Palavras podem possuir vários significados. O silêncio também.
O que significa cada silêncio?
Não adianta perguntar, não ouço respostas.
Só o silêncio.

Eu não sei dizer
Nada por dizer
Então eu escuto
Se você disser
Tudo o que quiser
Então eu escuto
Fala
lá, lá, lá, lá, lá, lá. lá, lá, lá
Fala
Se eu não entender
Não vou responder
Então eu escuto
Eu só vou falar
Na hora de falar
Então eu escuto
Fala
lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá
Fala

(João Ricardo/Luli)

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